good girls go to heaven, bad girls go everywhere...
Nada da minha vida foi dado de bandeja, nem no meio familiar. Para tudo tive de lutar e esmerar-me… E em tempos fiz disso missão de vida; esmerar-me para ter boas notas, bom emprego, ser boa profissional, boa filha, boa rapariga, muito, muito atinadinha… Atinadinha até demais…
Um dia acordei a chorar sem vontade de ir para um trabalho, pago acima da média, mas onde tinha de lidar com estratégias tortas e pessoas ainda mais tortas que preferiam olhar para o seu umbigo antes de olhar para o âmbito da sua actividade pessoal. Nada daquilo para qual tinha lutado fazia mais sentido… Nem no trabalho, nem em casa… A partir desse dia encetei outro tipo de viagem. Deixei de ser uma menina atinadinha… Preparei a minha saída, negociei a minha rescisão de contrato efectivo, trouxe a minha indemnização e pouco tempo depois estava de viagem de férias para a Holanda…
Esse foi o primeiro passo. Depois quando voltei envolvi-me em tudo o que era projecto profissional doido mas que me dava gozo. Trabalhei nos últimos 4 anos por gozo, mal paga mas retirando do que fazia o máximo gozo e experiência possível. Pelo meio parei 5 meses para olhar para dentro e traçar o meu perfil, cortei vários cordões umbilicais nessa altura. E criei o C_mim onde traduzir uma parte na outra pode ser, ou não, uma questão de arte.
Quem me vê de fora deve achar que eu não bato bem da bola, que sou estranha e sem rumo… quando digo que estão enganados antes pelo contrário, não creio que acreditem… Acho que genéricamente é convencionado seguir um certo rumo socialmente correcto: trabalho - compra de casa / carro - familia e a vida a escorrer como areia...
Enfim, comigo tudo corria mais ou menos bem até ao final do ano passado em que ultrapassei os famigerados 10.000€ anuais a recibos verdes e deixei de estar isenta de IVA e retenção na fonte. Depois de avaliar a situação compreendi que não valia mais trabalhar por minha conta. E comecei a procurar emprego…
Das entrevistas a que já fui, já vi uma amostra do país real. Já preenchi formulários onde perguntavam com que animal me identificava... Já tive recrutadores a perguntarem para falar um bocadinho sobre mim…. Para eu identificar 3 características positivas e 3 negativas ou melhor estilo narcisico… Já fui para aí a 15ª entrevista do dia e tive a sensação que estava a ser atendida numa qualquer repartição pública… Já me perguntaram se queria mesmo ser comercial bate porta quando antes me tinham dito que eu tinha perfil para marketing – sou licenciada em marketing – e aquela que dói mais ouvir: “Tem de ter uma actividade onde possa fazer várias coisas, não pode fazer sempre o mesmo… E tem mesmo perfil para gestão de marketing.”
Porreiro, ainda bem que tenho perfil para fazer coisas diferentes ao mesmo tempo e que tenho perfil de marketeer… Por mim, contento-me em ter perfil para fazer alguma coisa de jeito e com sentido. Trabalho há 14 anos, fui trabalhadora estudante, a minha tese de bacharelato valeu 19 valores e a de licenciatura 17, entre os dois executei o projecto do bacharelato… Já trabalhei no grupo SONAE e com ministérios… Já fiz projectos de informática, formação, desenhei produtos, serviços, também já atendi telefones, fiz atendimento ao público e brinquei no chão com crianças…
Por vezes parece que Portugal não precisa de portugueses, infelizmente são ainda bastantes os portugueses que precisam de Portugal. Neste país burocraticamente barroco, profissionalmente balofo ter um bom QI – Quem Indica – parece ser fundamental. Por vezes observo 10 pessoas a trabalhar com honestidade e dedicação para logo haver, no mesmo espaço, outras 20 a tramar quem trabalha. Estranha sociedade ocidental a nossa… Ser social não é sinónimo de ser solidário. Ser cidadão não é sinónimo de direitos e deveres iguais. Ser indivíduo é sinónimo de ser individual.
E pronto... Hoje foi um desabafo.